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Sobre o tema

As relações entre a filosofia e a política, tão prementes e necessárias nos conturbados dias atuais, têm uma rica e longa história no pensamento ocidental. Quando Sócrates se referia à filosofia e particularmente ao filósofo como aquele que detinha a sabedoria, ao mesmo tempo o qualificava como amigo da sabedoria e, como tal, o filósofo era aquele que estaria preparado para governar a cidade e preservar os interesses da coletividade. Direito e moral estavam conjugados, pois o governante deveria se mostrar como modelo de virtudes, e como sábio sentiria aversão ao que é torpe, seria um bom governante, zelaria pelo bem comum e se preocuparia de dia e de noite para que sua imagem refletisse qualidades, tais como, sabedoria, honestidade, magnanimidade e generosidade.  O governante seria o modelo de virtudes, e a preparação intelectual seria a sua maior fortuna.

Xenofonte nos dizia que o homem é um ser divino e duas vezes livre: a primeira, por natureza, a segunda, pelas leis. Uma concepção moral muito recorrente entre os gregos e romanos que mantinha uma relação de equivalência entre a natureza exterior e a natureza interior, isto é, entre Cosmos e Ethos. O ideal de cultura na Antiguidade continha a ideia de ordem e medida. A cosmologia antiga se explicitava na filosofia moral e incidia por sua vez no âmbito da política. A lei natural positivada pressupunha o direito civil e o direito constitucional. A lei que representava a ordem e a medida era considerada divina e se equivaleria ao ideal de justiça que deveria prevalecer e conduzir as ações humanas. A lei natural e divina se constituía como a imagem social da justiça que normatizaria a vida em sociedade.

Os autores medievais, por sua vez, assimilaram em grande medida a cosmologia e a metafísica grega.  No entanto, a cultura cristã nos traz a boa nova, isto é, a figura de Cristo ou o logos que se fez carne. As assimilações se constituem quando Orígenes, Agostinho, Tomás de Aquino e uma quantidade de autores medievais se apropriavam da noção de lei divina e lei natural. Para os medievais, a lei eterna é diferente da lei divina inscrita nos corações dos homens por Deus. O logos divino, revelado se constituirá como a condição de mediação para o cristão contemplar a lei de Deus. Esquematicamente temos a lei eterna, a lei divina, revelada, e a lei natural que incidirão na vida social e organizada e consequentemente na formação do Estado. O homem saberá o que deve fazer, em virtude de algo que seja natural a ele, que é sua racionalidade, a qual o torna partícipe da obra da criação. Assim, as noções de direito e de justiça serão fortemente marcadas pela cultura cristã. Na Idade Média, o evento da lei revelada aparecerá como a positivação da lei eterna, e a lei natural como participação da lei eterna na medida e em virtude da razão humana.

Com o advento do Renascimento, a representação do Estado, de direito e de justiça se alteram. O jusnaturalismo moderno mantém como acontece com a doutrina de Grócio, a ideia de Deus como fundamento da razão, no entanto, não será da lei eterna que decorreria a legitimidade do Estado e da justiça, mas da lei natural como a expressão dos ditames da razão. Só a razão humana aparecerá como manancial de conhecimentos claros e distintos, capazes de orientar melhor a vida política. Embora o homem moderno reconheça a importância de Deus, a separação entre a cidade de Deus e a cidade dos homens estava em curso. No contexto da modernidade, será principalmente a cidade dos homens que será exaltada pelos autores humanistas do Quatrocento e Cinquecento italiano, como demonstravam as retóricas de Francesco Petrarca, Leonardo Bruni e Colucio Salutati, assim como o imperativo categórico kantiano e os liberais e contratualistas, tais como Hobbes, Locke e Rousseau. A subjetividade do homem moderno e a certeza de que só a razão é capaz de conhecer seria suficiente para pensar as relações entre a política e a ética. O homem como centro do universo, e como indivíduo com seu poder de agir e sua capacidade incondicional de produzir leis, orgulhoso de sua força racional e de sua liberdade, não duvidará que ele próprio poderá elaborar as leis e os contratos e gerir o Estado. Ele será capaz de construir por si mesmo a regra de sua conduta. O homem compreendido como sujeito de razão construirá o ideal de Estado e de justiça independentes da teoria da iluminação em Agostinho, do poder pontifício e da dogmática cristã.

Os ideais iluministas diferentemente do estado absolutista se tornavam mais evidentes com a ascensão da burguesia e corroboravam para o fortalecimento do Estado liberal. A burguesia, ao se constituir como classe, concordava com a livre iniciativa de mercado sem a intervenção do Estado e com o mínimo de interferência na vida social. No entanto, o que a burguesia não contava era com o fenômeno da Revolução Industrial e o surgimento de uma nova classe: o proletariado. As ideologias de Marx e Engels e a ideia de um Estado socialista contribuíram para o despertar da consciência de classes e consequentemente da luta de classes entre patrões e empregados, com o objetivo de proteger o direito dos trabalhadores e de diminuir as desigualdades sociais.

No século XX, o Estado aparece comprometido com a função social, isto é, responsável por garantir os direitos sociais, tais como a seguridade social, a educação, a cultura, o meio ambiente; de um modo geral, deve se preocupar e zelar pelos direitos sociais fundamentais do cidadão. Dessa maneira, a política, compreendida como prática política, isto é, como o exercício das atividades políticas, depende, por sua vez, de homens hábeis em organizar e dirigir a sua conduta nas suas relações com os outros homens. O governante deverá conceber o Estado como uma sociedade organizada com um governo autônomo e que represente o papel de uma pessoa moral e distinta em relação às outras sociedades análogas com as quais está relacionada. Assim se justifica o sentido usual do termo política que ficou para a posteridade, isto é, como uma ciência que concerne ao Estado e ao governo, e sobretudo ao bom Estado, governado por homens honestos e responsáveis em administrar os interesses coletivos.

O advir das duas guerras mundiais, as revoluções bolchevique e cubana, as ditaduras militares e o chamado triunfo do capitalismo fizeram patente a inserção de uma nova categoria filosófica para pensar a relação entre filosofia e política e suas consequências a respeito do direito, do Estado e da justiça: a biopolítica. A categoria, que aparece com Michel Foucault numa conferência sobre medicina social no Rio de Janeiro de 1974, põe em evidência a centralidade do poder de agir politicamente sobre a vida humana. A prática política como biopoder, no contexto do triunfo do capitalismo liberal e da governamentabilidade, levará a pensar o corpo como uma categoria filosófica central para pensar a relação entre Estado, direito e justiça. A biopolítica como uma política sobre a vida, para permitir viver ou matar, segundo a figura do direito romano antigo do Homo Sacer, transforma o social numa estrutura biológica, num organismo vivo, isto é, um corpo social onde o corpo do indivíduo não tem direito. O problema a ser pensado filosoficamente, consequentemente, é como sair de um Estado de exceção permanente? Como garantir o respeito dos direitos humanos na condição de exceção permanente do Estado? Como fazer justiça dos corpos desaparecidos e negados pelo biopoder?

As profícuas relações entre filosofia e política ao longo da história dão relevância ao tema “Filosofia e Política: Estado, direito, justiça” e fazem da XXII Semana de Filosofia uma oportunidade singular de reunir a comunidade filosófica maranhense, de promover intercâmbios e de dar publicidade a pesquisas com o potencial de auxiliar a compreensão do nosso próprio tempo, tão necessitado de contribuições que nos permitam entender as transformações por que passamos.

Comissão organizadora:

 

Coordenador: Prof. Dr. Luis Hernán Uribe Miranda. Departamento de Filosofia - UFMA.

 

Demais docentes membros da comissão:

 

Prof. Me. Hamilton Dutra Duarte. Chefe do Departamento de Filosofia - UFMA

 

Profa. Dra. Maria Olília Serra. Coordenadora da Licenciatura em Filosofia. Departamento de Filosofia - UFMA

 

Prof. Dr. Marcio Kléos Freire Pereira. Departamento de Filosofia - UFMA.

 

Prof. Dr. Sidnei Francisco do Nascimento. Departamento de Filosofia - UFMA.

 

Prof. Dr. Aldir Araújo Carvalho Filho. Departamento de Filosofia - UFMA.

 

Prof. Dr. Plínio Santos Fontenelle. Departamento de Filosofia - UFMA.

 

Carlos André Chaves de Araújo. Estudante da Licenciatura em Filosofia/UFMA. Membro do CAFIL.

 

Elayne de Araújo Pereira. Estudante da Licenciatura em Filosofia/UFMA. Membro do CAFIL.

APOIO

CENTRO ACADÊMICO DE FILOSOFIA

DEFIL
Departamento de Filosofia da UFMA

As inscrições da XXII SEMANA DE FILOSOFIA estão sendo realizadas exclusivamente no Departamento de Filosofia da UFMA - campus Bacanga, até o último dia do evento.  
 


R$15,00 - ouvintes, alunos com envio de trabalho,alunos de gradução ou pós (até o dia 20/11/2017)

R$20,00 - ouvintes, alunos com envio de trabalho,alunos de gradução ou pós (após o dia 20/11/2017)

R$30,00 - professores  (até o dia 20/11/2017)

R$40,00 - professores (após o dia 20/11/2017) 

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